João Paulo Fonseca

João Paulo Fonseca

sábado, 22 de março de 2014

Os Burros

Na viagem de le Puy-en-Velay, outro caminho de Santiago em França, fiquei marcado pelas histórias dos burros. Passo a contar.

Cheguei a Condom, já ao fim da tarde, humido e depois de um dia de trilhos de montanha mais propicíos a pedestres. Com muita lama e  aguaceiros desagradaveis. Procurei o convento onde alojam peregrinos. Instalei-me, tomei duche e lavei a transmissão da bicicleta. A sequencia do costume.

Fui jantar á sala de refeições do convento, destinada aos peregrinos.  Era fim de semana, as lojas já estavam fechadas, por isso não tive oportunidade de me prevenir com comida. Tinha um bocado de queijo e uma peça de fruta.

Preparava-me para iniciar o banquete quando uma peregrina, senhora para sessenta e tal anos, me convida para jantar na sua mesa.  Estava com a sua amiga tambem da mesma idade.
Devem ter pensado: temos de socorrer aquele desgraçado senão, a comer assim, amanhã nem força tem para pegar na bicicleta.
Dividiram o seu jantar comigo.  Não me lembro o que comi. Mas o momento foi delicioso.

Primeira lição: Solidariedade.

Quais eram as suas historias?

Estavam ambas reformadas, uma foi professora e a outra foi secretária clinica de um consultório médico.
Decidiram fazer o Caminho de Santiago a pé
.... com um burrinho. Fiquei estupefacto.

Contaram que nunca antes tinham lidado com animais. Mas ao fim de alguns dias de marcha já eram um trio unido.

 A etapa desse dia tinha sido dura. Os peregrinos e bicigrinos (peregrinos em bicicleta) tem de passar várias cancelas de gado estreitas, e presas com uma mola teimosa.
 Imaginem em terreno acidentado a subir. Segurar a cancela com uma mão.  Com outra mão empurrar ou puxar a bicicleta pesada, era como calhava. E os pés a escorregar na lama. Disse muitos palavrões.

Ora estas senhoras contaram-me a rir divertidissimas, que nas primeiras cancelas demoravam quase duas horas a retirar os alforges do burrinho, e voltar a colocá-los após a cancela. Mas depois com a frequencia da manobra demoravam menos de metade do tempo.

Segunda lição: Há sempre alguem com um problema pior que o nosso.

As senhoras não dormiram no albergue. Dormiram em tenda no jardim do convento, junto ao burrinho. Mais admiração ainda.

Com manifestei espanto disseram-me: isto não é nada. Com um dia de avanço, está uma familia francesa, composta por um casal e quatro crianças mais dois burrinhos.

Duas meninas de 8 e 12 anos, um rapazinho de três anos e um bébé de 18 meses!!!!!!

Quatro crianças a pé até Santiago, a acampar... 2 meses.

Terceira lição: A vida tem muitas cores e sabores.



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